sábado, 18 de junho de 2016

Resumo + análise: Dom Casmurro - Machado de Assis (leituras UFRGS 2017)

Escrito em  1899, Dom Casmurro  é uma das maiores obras de Machado de Assis.  A história se popularizou pelo triângulo amoroso que apresenta, além da dúvida principal que deixa para o leitor, que não tem uma resposta exata quanto ao possível adultério de Capitu.

Entretanto, esse livro vai muito além das questões à respeito do romance. Ele trás um grande conhecimento sobre os hábitos da época, uma análise clara da sociedade do Rio de Janeiro e dos costumes religiosos (forte característica apresentada).

A história é narrada pelo próprio Dom Casmurro, um advogado de meia idade, amargurado pelo rumo de seu amor de juventude.  Já nos primeiros parágrafos ele explica o apelido devido ao fato de ser um homem calado, fechado em si, e então começa a contar o por quê de ter se tornado assim.

Desde jovem, Bento Santiago sabia que estava destinado à ser padre. O primeiro filho de seus pais
não chegou à nascer, então sua mãe, Dona Glória, promete que se Bentinho "vingasse" ela lhe faria padre. O seu pai morreu antes de saber da promessa, mas o fato é que Bentinho nasceu e cresceu forte e saudável, motivo pelo qual tinha destino certo. Nesse ponto já percebemos o quão forte são os costumes religiosos da época: em muitos momentos Dona Glória parece arrepender-se de ter feito uma promessa tão séria a ponto de tirar o livre arbítrio de seu filho, mas uma promessa feita jamais poderia ser desfeita, era uma dívida com Deus.

Então, em uma tarde comum, Bentinho está ouvindo atrás da porta quando ouve José Dias lembrar a mãe da promessa, falando que a mesma deveria fazê-lo padre logo, uma vez que o menino já está crescendo e apresentando uma relação cada vez mais estreita com a vizinha Capitu, e que ambos estão sempre "de segredinhos e metidos pelos cantos".

O narrador então se desvia contando a história de José Dias, personagem de grande importância para a narrativa. O mesmo não faz parte da família, é um agregado. Mentiu que era médico e trouxe a cura para escravos enfermos anos atrás, conquistando a simpatia da família, que convidou-lhe para morar junto. José Dias não aceitou e partiu, mas meses depois voltou arrependido, contando que nunca foi médico de verdade e aceitando o abrigo.

É importante ressaltar que nessa época era muito comum que cada família tivesse um ou mais agregados morando em suas casas. José Dias desempenha então inúmeras funções como uma forma de gratidão pela acolhida que recebeu. É conselheiro, mandalete e um grande bajulador. Outra característica a ser observada nele é o constante uso de superlativos em sua fala: belíssimo, amaríssimo, gravíssimo... tudo é exagerado, teatral.

Após apresentar o personagem. a narrativa volta então para o momento em que Bentinho ouvia atrás da porta e o narrador deixa claro que a denúncia de José Dias também serviu-lhe para que notasse que de fato sua relação com a vizinha Capitolina está cada vez mais íntima.

Ambos cresceram juntos e têm uma linda amizade. Moram lado a lado e possuem uma espécie de portão entre os dois pátios, facilitando a comunicação. Brincam juntos, conversam e não se desgrudam há muito tempo. E, apesar de ainda serem criançolas, como o próprio Bentinho afirma (ele tem quinze anos e Capitu, quatorze), ele começa questionar se a denúncia do agregado faz sentido, percebendo que seus sentimentos por Capitu realmente são mais fortes que uma simples amizade.

Capitu é tudo que Bentinho não é: decidida, impetuosa e sempre parece saber o que fazer, enquanto ele apenas obedece ordens. Ela tem, como descreve o agregado, "olhos de cigana oblíqua e dissimulada" e é uma das personagens mais ambíguas já descritas: nunca é possível saber suas reais intenções nas atitudes que tem.

Após ouvir o que José Dias fala, Bentinho vai até Capitu para contar-lhe que em breve irá para o seminário, então percebe que ela escreveu no muro o nome de ambos, mostrando nesse momento que o sentimento é recíproco.

Porém, como já falado anteriormente, a narrativa é toda contada por um Bentinho já mais velho e amargurado, um Casmurro que desde o início da história tenta dar ao leitor pistas da personalidade dissimulada de Capitu.

A primeira demonstração disso é quando, logo após ver a escrita no muro, Bento e Capitu começam a se olhar fixa e apaixonadamente, como que confessando dessa forma o amor que sentiam e, quando estão se aproximando, o pai de Capitu entra em cena e a menina logo assume outra postura, apagando a escrita do muro e tagarelando com o pai afirmando que estavam brincando de um jogo do sério.

Outro momento em que observamos esse traço da personagem é quando, dias depois, Capitu toma a iniciativa de dar o primeiro beijo em Bentinho. Ela o faz quando o mesmo está lhe penteando os cabelos  e nesse momento o pai dela novamente chega na sala. Capitu rapidamente começa a rir e brincar, falando que Bentinho não sabia fazer-lhe tranças, falando com seu pai e avisando sua mãe para servir o jantar, enquanto Bentinho ainda está embasbacado pelo beijo.

Um ponto importante à ressaltar é que Dom Casmurro trata-se de uma obra do movimento realista, tendo como principal característica o fato de, diferente dos romances românticos, aqui nenhum dos personagens é idealizado ou perfeito. Tratam-se de pessoas muito reais, na maioria da vezes com bem mais defeitos do que qualidades. Enquanto no romance romântico um triângulo amoroso seria composto de mocinho, mocinha perfeita e vilão, um triângulo no realismo é composto por homem (Bentinho), mulher (Capitu) e amante (Escobar), todos com muitos defeitos (orgulho, adultério, ambição, vaidade etc).

Outro traço relevante é o fato que a obra não obedece uma ordem cronológica. O tempo todo o livro divaga entre lembranças de Bentinho já mais velho (Casmurro), momentos e pensamentos do presente e pausas para descrição dos personagens citados. É numa dessas divagações que Bentinho conta mais sobre Pádua (pai de Capitu), prima Justina  e tio Cosme (parentes viúvos que vivem na casa dos Santiago).

Bento então volta das divagações e conta que Capitu, indignada com o fato dele ter que ir ao seminário, primeiro revolta-se contra Dona Glória, chamando-a de beata e papa-missas, mas depois sugere à ele que convença o agregado a mudar a cabeça de sua mãe. Bentinho se enche de esperança, mas, ao falar com José Dias, o mesmo fala que será difícil tarefa, uma vez que Dona Glória é extremamente religiosa.

Passados alguns meses, Bentinho acaba tendo que ir ao seminário, mas antes disso promete à Capitu que voltará e ambos se casarão. Ela devolve a promessa, falando que jamais casaria com outro que não fosse ele.

No seminário, Bento conhece Escobar, um moço muito bonito e com "olhos fugitivos". O mesmo possui um carisma inigualável; não há quem não goste de Escobar e logo ele e Bento se tornam muito amigos, a ponto de compartilharem seus segredos: nenhum dos dois pretende se tornar padre. Bentinho quer sair de lá para casar com Capitu e Escobar tem o sonho de ser comerciante. Em pouco tempo, Escobar passa inclusive à frequentar a casa de Bentinho, onde também conquista à todos.

Quem também se faz cada vez mais presente na casa dos Santiago é Capitu. Sutilmente, ela faz de tudo para mostrar à Dona Glória que seria a nora perfeita, para o caso da mesma mudar de ideia e permitir que Bento saia do seminário. Capitu mostra todas suas habilidades, costura, cozinha, toca, acompanha Dona Glória em tudo e vai cada vez mais ganhando o carinho e confiança da futura sogra.

Já ao agregado, cabe a tarefa de mandalete, levando notícias de Bentinho à família e vice-e-versa. Numa de suas idas ao seminário, Bento questiona por Capitu e quando José Dias afirma que a menina está feliz e sorridente como sempre, Bentinho fica transtornado. Ele não entende como pode Capitu estar tão alegre com sua distância, enquanto ele chora de saudades todas as noites. Nesse ponto, novamente o autor põe em pauta uma das principais questões do romance: seria Capitu dissimulada e falsa em seus sentimentos por Bento ou o ciúme e posse excessivos no narrador lhe fariam desconfiar tanto?

Após inúmeras tentativas de encontrar uma solução que lhe tirasse do seminário, quem dá a ideia é Escobar: Dona Glória havia prometido para Deus que se Bentinho vingasse, Lhe daria um padre, mas Escobar conclui que esse padre não precisaria ser necessariamente Bentinho. Bastava que a beata adotasse um menino disposto a desempenhar tal função em troca do abrigo que lhe daria. Bentinho fica eufórico com a ideia e a propõe à sua mãe, que logo aceita, pois já não aguentava mais de saudades do filho e fazia gosto que o mesmo viesse a se casar com Capitu.

Bento então sai do seminário, assim como Escobar. Ele vai estudar leis e se torna advogado, para o orgulho da família. Volta anos depois, quando casa com Capitu. Escobar também realiza seu sonho: torna-se comerciante e acaba casando com Sancha, a melhor amiga de Capitu. Nesse momento, Machado altera sua forma de narrativa. Até então, a história é dividida em mais de cem capítulos, todos curtos e contados em detalhes, de forma que os fatos ocorrem lentamente. Após o casamento de Casmurro e sua amada, cada paragráfo representa um salto de meses ou até de anos.

A vida dos dois casais não podia ser mais feliz. As amizades de Capitu e Sancha e de Bentinho e Escobar se mantiveram, de forma que era comum que se visitassem muito e fizessem várias coisas juntos. A única coisa triste em meio à tanta alegria era que enquanto Escobar e Sancha já tinham uma linda filha (a qual carinhosamente batizaram de Capitu), Bento e Capitu tentavam mas não conseguiam engravidar.

Tentaram por muito tempo e muitas vezes Casmurro reclamou para o amigo por Deus não lhe conceder a graça da paternidade, então, finalmente Capitu engravida, dando a luz à um lindo e saudável menino, o qual chamaram de Ezequiel (homenagem à Escobar, que se chamava Ezequiel Escobar).

O menino vai crescendo e adquirindo traços muito parecidos com os de Escobar, deixando Bento
cada vez mais desconfiado de uma possível infidelidade da parte de Capitu e Escobar para com ele. Aos cinco anos, Ezequiel tem o hábito de imitar tudo e todos e quando imita Escobar todos sempre falam que o menino se assemelha muito ao amigo. Tal semelhança seria mais uma das paranoias de Bento ou será que realmente Escobar havia dado à Capitu o filho que ela tanto pediu com Bento?

Então, uma tragédia acaba acontecendo: um dia, ao nadar, Escobar morre afogado, para a surpresa e tristeza de todos, especialmente de Capitu. No velório, Bento afirma notar o olhar fixo e apaixonado de sua esposa para o defunto, o que começa a lhe dar ideias sobre suicídio.

Amargurado e se sentindo profundamente traído, Bento chega a comprar veneno,  no intuito de tirar a própria vida, mas, em casa, observando o filho tão parecido com Escobar (os mesmos olhos, o mesmo sotaque francês, a mesma inteligência para matemática, o rosto...), ele tenta envenenar Ezequiel, que se recusa a tomar a bebida.

Percebendo o ocorrido, Capitu revolta-se e pergunta o motivo. Bento afirma saber que não é pai do menino, acusando-a de adultério com Escobar e a mesma se ofende, falando que nem mesmo os mortos escapam dos ciúmes doentios de Bentinho. Após a discussão. ela e Ezequiel acabam indo embora para Europa, de onde segue enviando muitas cartas para Casmurro.

As cartas de Capitu nunca são respondidas e, mesmo indo para Europa inúmeras vezes, Bento nunca se dispôs á visitá-la. Ele afirma que teve muitas outras mulheres que lhe consolaram de tamanha tristeza e sentimento de traição, mas que nenhuma delas teve seu coração como sua amada Capitu.

Alguns anos depois, Capitu acaba falecendo e Ezequiel volta a procurar o pai, mas Casmurro afirma que ver o rapaz crescido só lhe deu mais certeza da traição que sofreu: ver Ezequiel era como ver Escobar ganhar vida novamente, ambos eram iguais em aparência e personalidade. O rapaz fica apenas alguns meses na casa do pai, indo novamente embora e morrendo logo depois. Casmurro cobre as despesas do funeral, afirmando que pagaria o triplo para nunca vê-lo novamente.

Assim, a história termina, do ponto onde começou. Bento é Casmurro, amargurado, fechado em si e solitário. Ele afirma a sensação de se sentir traído, mas a história é narrada apenas do ponto de vista dele, motivo pelo qual fica sempre o questionamento se Capitu realmente traiu ou se os ciúmes de Bento que deixaram-no cego para a verdade.



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Pessoal,

Espero ter ajudado a compreender melhor a obra com a resenha/análise realizada. Em caso de dúvidas, me coloco à disposição. Um grande abraço!

3 comentários:

  1. Adorei!! Parabéns e obrigada! Seria possível tu fazer um resumo/resenha/análise de Morangos Mofados, do Caio Fernando Abreu?!

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  2. Fico muito feliz que tenha gostado, Fernanda! Seu pedido será atendido em breve! Aliás, serão feitas as análises de todas as leituras obrigatórias! Desde já, boa sorte no vestibular!

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